terça-feira, 30 de abril de 2013

A casa que eu vou morar

Toda feita de tijolos. Há uma rampa curva na entrada e uma roseira bem em frente. Da varanda entreaberta do andar de cima, vê-se um lustre um pouco antigo, como um que havia na casa de minha tia e já não se encontra mais. A luz amarela me pareceu tão cálida que me fez querer entrar, dormir, morar ali, morrer ali.
Pensei que ali eu não seria tão sozinha, ou a solidão não me perturbaria o juízo, que já anda assim tão desgastado. 
Talvez eu abrisse as janelas e deixasse o dia entrar, talvez eu vivesse todos os dias. Só uma casa e o que poderia ser se eu nela pudesse entrar. Como eu a faria clara, alegre e perfumada de alecrim, compraria flores, quem sabe, para enfeitar a sala. Teria lençóis brancos e uma parede carmim. Eu diria todos os dias "eu te amo" aos pássaros ou às flores. Na verdade não importa, eu só diria, talvez para mim. Talvez eu finalmente me amasse por viver onde quis. Talvez até alguém amasse como eu a casa de tijolos, onde em frente cresce uma rosa bem vermelha, que de tão linda, ao chegar ali, antes mesmo de abrir a porta eu já teria uma razão para sorrir. 
Talvez hoje eu tivesse que sair sozinha e andar devagar mesmo até dar de cara com o meu sonhado futuro lar, que de não ser como imaginei é exatamente do que preciso. 
Acho que nunca soube realmente qual é o meu lugar, talvez eu nunca tenha um lugar, mas sonhei com muitos, tenho milhões de lares imaginários, milhões de afetos perdidos e ternuras ultrapassadas. Tenho até esta ideia de que algum dia serei feliz, volta e meia me pego acreditando nela, como se hoje fosse apenas a espera. Tomara que não demore... 

segunda-feira, 22 de abril de 2013

"Agora era fatal, que o faz de conta terminasse assim"

Em algum lugar um sorriso e então me esqueço de ir embora, aí se fecha uma porta e logo uma janela, fico procurando uma árvore de algum quintal, ou de um livro que li -quem sabe uma vaca voando- uma fresta de luz qualquer, qualquer sentimento. E tudo vai ficando escuro e eu com frio, já não sei o caminho, ou se há estrada, tudo calado, e o silêncio gritando cada vez mais, eu permaneço pensando, e o que não daria para não pensar, meu medo vem dessa ideia desordenada que existe em mim, da fantasia de me fazer feliz.
Eu não saio por aí perguntando se as pessoas são ou não felizes, se os seus amores perdidos deixaram marcas e de que tamanho, porque sei que deixaram, e é tudo. Ninguém é feliz, a vida é por tanto uma eterna busca, somos escravos dela -quase todos- mas não sei da minha, se demoro, volto logo ou nunca mais, se permaneço em cada abraço, se desmorono, me desfaço, se eu espero que algum dia a vida se faça uma coisa tão nova que de repente tenha algum sentido. O que sei é tão simples quanto ser quem sou, há um grito que não silencia dentro de mim, que me manda fazer o que for, o que eu quiser. Não há que entender, quando vi já me fiz sofrer.
Aí tem os lugares por onde andei me lembrando que existir é constante, não tem onde a gente possa se esconder, não dá pra desaparecer como eu tanto gostaria, muito mais que gostaria. Tem as fotos que rasguei me lembrando as escolhas erradas que fiz, e foram tantas. Tem as ruas tortas, os pesadelos que insistem em me atormentar, a maldade alheia que ainda me dá medo. Tem toda a inocência que ainda há em mim e a terrível resposta do mundo, de não me permitir preservá-la.
Tem um pouco de "João e Maria" de Chico, em mim, um pouco de praia, de não me importar, e tanto pavor do que vem agora, do que a vida manda, do que eu quero. Então lembrei que existo, e dentro de mim há dimensões desconhecidas e só minhas, pra onde eu posso fugir quando tudo se acabar.