terça-feira, 28 de agosto de 2012

Ela é o desastre


A pessoa que eu sonhei ser está perdida, às vezes tão distante de quem me tornei, às vezes sou apenas eu, que não me enxergo mais.
Denominar-me um desastre natural se tornou a brincadeira mais séria de minha vida, não é um pedido de desculpa, nunca foi uma desculpa, jamais soube dizer a mim mesma que tudo isto está errado, que ser um grande desastre quase sempre, não pode estar certo.
Ainda que passe o tempo eu espero acordar deste pesadelo cheio de agonia. Agonia de não ser a mulher que sonhei; agonia de não querer nada além de um colo; agonia de não poder mais me olhar no espelho sem procurar o disfarce perfeito; agonia de já não poder escrever, de não ter o que dizer.
Será que a alegria da gente é sempre uma grande ilusão? Será que não haverá o mínimo suspiro aliviado? Será que no caminho não há nada ou ninguém capaz de me tirar deste inferno? Notei, logo após a última lágrima cair, que voltei a usar as palavras como há tempos não usava, que finalmente volto a dizer apenas o que sinto. Tomo-me em devaneios.
Ando adiando tudo o que tem que ser vivido, dizendo que não sinto saudade, fingindo que tudo é tão adequado, repetindo que quando tiver tempo eu vou viver, e agora, não sei o que fazer comigo, não sei para onde devo ir ou como faço para consertar tudo quebrado em mim. E talvez amanhã quando o sol sair, eu aceite que não sou capaz de fazer tudo certo, que todo este conflito faz parte de mim, que talvez eu seja mesmo assim, naturalmente desastrada, um desastre natural, e esteja só esperando que alguém olhe bem dentro de mim e me mostre o caminho certo quando as coisas fogem ao meu controle.
Queria saber como é me sentir a salvo. Como é não perder tanto tempo com teorias de como a vida deve ser, de como eu tenho que ser. Porque de todos os meus incontáveis defeitos e falhas, o maior deles é ser infeliz a maior parte do tempo, enquanto repito, incansável e constante, que "está tudo bem", enquanto respiro por outras pessoas e me apego em outras histórias com este medo horrível de voltar a sentir dor.
Pois então, acho que aconteceu de novo, estou aqui, no mais profundo dentro de mim, no lugar mais escuro e vazio que poderia imaginar, não me forcei a chorar e nem é difícil escrever daqui de dentro, tudo flui com uma naturalidade incrível, então, será que finalmente estou me permitindo sentir dor? Será que é este o meu modo de pedir socorro? Será que de algum modo isto pode ser bom? Será que milagrosamente, alguma coisa começou a fazer sentido dentro de mim quando me encontrei completamente nua e sem disfarces? Ouvi um suspiro fugaz, então fechei os olhos e de repente eu me vi sem reservas, como um bicho, puro instinto, eu fui indo e indo, e então cheguei aqui, onde as flores estão mortas e caídas pelo chão, onde as pedras nos impedem de andar, onde a escuridão não termina, onde só existem palavras, as palavras mais tristes de que me recordo, e toda a confusão do lado de fora já não me perturba, me tenho inteira.
Volto a voar na escuridão, sinto que por um tempo ainda será tudo o que tenho, sinto que começar de novo se tornou a minha maior lição, e depois de ter lutado tanto para aprender a voltar atrás, tenho apenas um novo desafio. Existe uma ferida aberta e tantas cicatrizes, mas não faz mal, quando se vive como eu é difícil terminar o dia sem um arranhão, é difícil não despertar os piores olhares das pessoas e às vezes suas piores dimensões.
Daqui de dentro entendi que tenho me condenado por ser o que sou, me chamo um grande desastre, sou um enorme perigo e as pessoas não saem ilesas ao meu lado, porém, ainda assim, algo insiste em bater numa tecla, este algo me diz que a bondade é mesmo a única coisa que nos salva no final do dia, que nos permite algum sossego, e é ela que há de me salvar.
Sei que vou descobrir de novo que não há nada que preencha os meus espaços vazios, sei que então vou tropeçar novamente, dizer ou fazer a coisa errada pensando por algum estúpido mecanismo de defesa, e vou ter que levantar mais uma vez sozinha. Sei que vou acordar e lembrar que já não sei onde estou, então vou repetir que não posso mais, que sou fraca e incapaz de viver com o que me fere, sei que vou fugir enquanto puder. Novamente vou abrir a janela e chorar até cansar, implorando, sei lá para quem, que me tire daqui, que me ensine a ser melhor, porque ser sempre um desastre me tem destruído por completo. Então vou deitar em minha cama quente e fingir que a noite pode durar para sempre, que eu nunca mais vou ter que acordar.
Por hoje, me resta acreditar que quando o sol raiar mais uma vez, o ar que me roubaram vai voltar aos poucos, e todo o açúcar do mundo vai adoçar meu novo dia, que por aí, em algum lugar, estão as respostas que procuro, e como a vida é repleta de encontros felizes, em alguma esquina eu vou dar de cara com a minha melhor dimensão, então todos os terríveis enganos, os mais torpes juízos e os erros, destes imperdoáveis, ao menos farão sentido, e talvez, com sorte, parem de doer.
Boa noite.

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